A questão Jorge Vieira


Jorge Vieira ficou conhecido como o "capitão perfeito", pela sua forte personalidade e cavalheirismo, notabilizando-se como o melhor defesa português do seu tempo, tendo jogado no Sporting durante mais de 20 anos, durante os quais participou na conquista de 7 Campeonatos de Lisboa, 3 Taças de Honra e do Campeonatos de Portugal da época 1922/23, sagrando-se assim Campeão Nacional de Futebol, isto para além de ter representado a Seleção Nacional 17 vezes, 15 das quais como capitão de equipa.

Foi também o primeiro árbitro português internacional, numa altura em que era habitual os grandes jogadores serem convidados para arbitrarem jogos importantes, pelo que foi escolhido para apitar um Espanha-Bélgica realizado em Bilbau.

No final da terceira década do século XX, um dos assuntos na ordem do dia no futebol português, era o "profissionalismo encapotado" ou o "falso amadorismo", que já era praticado em vários clubes, que compensavam financeiramente os seus melhores jogadores.

Nessa altura no Sporting defendia-se intransigentemente a pureza do amadorismo, ainda mais vivendo Clube um período de grandes dificuldades financeiras e, continuando por resolver a questão das instalações desportivas.

Em 1928 constou que Jorge Vieira teria tentado convencer o novo Presidente Joaquim Oliveira Duarte a ser mais flexível na questão das compensações monetárias aos jogadores, que já não se contentavam com pequenos almoços e lanches, antes e depois dos jogos, uma atitude que não foi bem recebida pela Direção do Sporting.

O que é certo é que com 30 anos de idade e acabado de representar Portugal nos Jogos Olímpicos, Jorge Vieira decidiu abandonar o Futebol, alegando que por motivos da sua vida particular, já não se podia preparar convenientemente.

Depois de alguns desentendimentos com os dirigentes leoninos, relacionados com o seu jogo de despedida, Jorge Vieira escreveu uma carta à Direção num tom áspero, que obteve como resposta a suspensão dos seus direitos de sócio até à realização da próxima Assembleia Geral, por se considerar a referida missiva desrespeitosa.

Numa altura em que os resultados da equipa principal de Futebol estavam abaixo das expetativas, Jorge Vieira foi alvo de uma onda de solidariedade que levou à convocação imediata de uma Assembleia Geral extraordinária para se discutir o seu caso que ficou conhecido como a Questão Jorge Vieira. Nessa reunião magna que se prolongou por duas sessões, Jorge Vieira e o Presidente Joaquim Oliveira Duarte travaram-se de razões, verificando-se que os cerca de 300 sócios presentes, estavam maioritariamente do lado do jogador, o que levou à demissão da Direção, alegando não ter condições para trabalhar num ambiente tão atrabiliário.

No final seria recusada uma proposta conciliadora de José Serrano, sendo levada a votação e aprovada com 144 votos a favor, 130 contra e 5 abstenções, a moção que elogiava as qualidades de carácter de Jorge Vieira e que declarava sem efeito os castigos que lhe tinham sido aplicados pela Direção demissionária.

Jorge Vieira voltaria à atividade na época seguinte e ainda jogaria na equipa principal do Sporting mais três temporadas, mas a questão de fundo manteve-se e pelo menos até ao dia em que o Sporting perdeu Eusébio para o Benfica, a maioria dos dirigentes leoninos continuaram a oferecer alguma resistência à implementação do profissionalismo, no convencimento de que principalmente para jovens oriundos das classes mais baixas, envergar a camisola do Sporting já era só por si um privilégio. 

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