O momento de viragem


As décadas de 40 e 50 tinham sido gloriosas para o Sporting, mas no inicio dos anos 60 verificaram-se alguns acontecimentos que foram determinantes para o futuro do Clube e que marcaram uma viragem no futebol português. 

Quando em Janeiro de 1959 Brás Medeiros chegou à Presidência do Sporting, tinha dois grandes problemas para resolver: a difícil situação financeira do Clube, essencialmente resultante dos encargos derivados da construção do Estádio José Alvalade, pelo que foi prometido um implacável regime de austeridade, que em parte passava por estancar os gastos com as secções amadoras, e a inevitável renovação do quadro de jogadores da equipa de futebol, encerrado que estava o ciclo vitorioso das equipas construídas à volta dos famosos Cinco Violinos.

Nessa altura Enrique Fernandez já fora despedido, pagando o preço das muitas alterações que fizera numa equipa que fora Campeã em 1957/58, mas que estava claramente envelhecida, isto quando se impunha a necessidade de profissionalizar totalmente o futebol, à semelhança do que o Benfica fizera depois da chegada de Otto Glória

Assim, o Sporting apostou no modelo do na altura tetra campeão europeu Real Madrid, mas à medida do nosso país, com uma equipa formada à volta alguns grandes jogadores estrangeiros (nesse tempo havia limitação no numero de futebolistas de outras nacionalidades). O Sporting que já contava com o argentino Diego Arizaga, assegurou então o concurso dos brasileiros Faustino e Fernando Puglia e do credenciado internacional peruano Juan Seminário, aos quais se juntou o luso brasileiro Lúcio, que tal como o sul africano David Júlio, tinha dupla nacionalidade. Depois ainda viria Géo, outro brasileiro.

Instalou-se alguma polémica com o Benfica a protestar contra as naturalizações e o excesso de estrangeiros, numa altura em que as relações entre os dois grandes clubes da capital estavam cortadas, depois do jornal brasileiro "O Globo" ter publicado uma carta onde  Brás Medeiros atacava fortemente o Benfica, ao mesmo tempo que os Sportinguistas se queixavam recorrentemente das "calabotadas", uma referência ao árbitro Inocêncio Calabote que fora irradiado.

Mas o grande erro de Brás Medeiros talvez tenha sido a cedência às pressões para despedir Fernando Vaz, um jovem treinador que era considerado como um discípulo de Cândido de Oliveira, quando o Sporting estava a apenas 1 ponto do Benfica, numa altura em que havia uma forte corrente que defendia a contratação de um grande treinador estrangeiro. 

No entanto, a verdade é que o Campeonato de 1959/60 foi decidido já com um treinador interino, numa tarde negra de Octávio de Sá que acabou por ser determinante para o futuro do futebol português, pois nesse dia o Benfica garantiu um lugar na Taça dos Campeões Europeus da época seguinte, competição que viria a ganhar, um feito gigantesco para um país pequeno, pobre e atrasado, como era Portugal nesse tempo e que deu ao principal rival do Sporting um enorme prestigio, e um embalo que lhe permitiu arrancar para um ciclo hegemonicamente vitorioso.


Como se tudo isto não bastasse foi também nesta altura que o Sporting perdeu Eusébio para o Benfica, ele que seria um jogador decisivo para a posição dominante que os encarnados passaram a ocupar daí para a frente. O que é certo é que neste caso o Sporting também se deixou ultrapassar pelo Benfica, no convencimento de que não seria preciso gastar muito dinheiro para trazer um jovem que vivia na pobreza africana e que jogava numa filial leonina. Nessa altura a mãe do jogador foi clara quando contou que o Benfica tinha oferecido "dinheiro grande" em vez de umas centenas de escudos que o Sporting lhe pusera em cima da mesa.

Outro fator determinante que aconteceu neste período, foi o início da guerra colonial. Salazar nunca ligara nenhuma ao Futebol, mas toda a gente já ouviu falar nos "três fff" (Futebol, Fátima e Fado) com que o ditador achava que podia entreter um povo pouco instruído, que via os seus filhos a partir para uma guerra sem sentido. Desde aí passou a interessar ao estado novo que o clube da populaça ganhasse mais vezes, e tendo o Sporting vários dirigentes ligados ao regime, alguns deles militares, a verdade é que não podiam fazer muito barulho, principalmente depois de Brás Medeiros ter sido repreendido pela DGD na sequência da tal publicação do "O Globo". 

O Sporting perdera a hegemonia, perdeu poder e perdeu Eusébio, sendo ultrapassado por um Benfica vitorioso, e nos anos que se seguiram foram cometidos uma serie de equívocos na contratação dos tais "grandes treinadores estrangeiros" numa altura em que Juca era "o bombeiro de serviço", ele que na condição de treinador interino até conseguiu ganhar um Campeonato e uma Taça de Portugal e que depois na época 1965/66 formou uma dupla de sucesso com Otto Glória, que foi desfeita quando os dois treinadores pediram uma melhoria dos seus contratos, que previam uma renovação automática nas mesmas condições se o Sporting assim o entendesse, pelo que aquelas exigências foram consideradas intoleráveis. Mas o pior mesmo foram as opções que se tomaram para substituir uma dupla que tinha acabado de ganhar o Campeonato Nacional e os resultados das mesmas.

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