O difícil caminho de um Peseiro diferente

Como todos os que me conhecem sabem, não sou por norma a favor das chamadas "chicotadas psicológicas", embora por vezes a situação dos treinadores se torne insustentável, pelo que o seu despedimento acaba por ser inevitável, mas obviamente este não é o caso do Sporting de hoje.

Depois da derrota em Portimão não faltou quem exigisse a cabeça de José Peseiro, um treinador que regressou ao Sporting com vários estigmas, resultantes do "caso Rochemback", da famosa época do quase e do seu percurso profissional recheado de insucessos.

Consciente disso mesmo José Peseiro tudo fez desde o início para alterar essa sua imagem de treinador que coloca as suas equipas a jogar um futebol atractivo mas que no fim não ganha nada, sem esquecer a sua falta de pulso na hora de manter a disciplina.

Assim tivemos desde o início um Sporting pragmático, sempre a pensar no resultado e bem longe de apresentar um bom futebol, com o seu treinador a cortar logo a direito em matéria de disciplina, quer com um jovem como Matheus Pereira, quer com o capitão de equipa Nani.

Para além disso Peseiro foi sempre bastante directo nas suas conferências de imprensa, e apenas em relação aos primeiros assobios das bancadas de Alvalade, revelou algum cuidado na forma como se referiu aos sócios e adeptos, na hora de lhes pedir alguma tolerância.

As principais acusações de que Peseiro tem sido alvo referem-se ao baixo nível exibicional da equipa, críticas que que assentam no indesmentível facto deste Sporting jogar muito pouco, mas devo dizer que há muitas atenuantes, desde uma pré época planeada à pressa e com poucos jogos, passando pelas indefinições na constituição do plantel e a chegada tardia de vários jogadores, até às lesões que tem atacado peças importantes como Bas Dost ou Jérémy Mathieu, entre outros, sem esquecer a má forma de gente que por razões conhecidas, não teve nem férias descansadas, nem pré-época em condições.

Apesar disso tudo José Peseiro lá foi construindo a sua equipa e ganhando jogos, mesmo que à rasquinha. Ou seja, deixou de ser um homem que privilegiava o futebol de ataque, mas que acabava por perder e passou a jogar feio e até a ter alguma sorte, como aconteceu na Luz e em Poltava.

A derrota em Braga foi o primeiro sinal de que os deuses lhe estavam a virar as costas, num jogo que o Sporting até controlou quase sempre, faltando-lhe apenas acertar na baliza, onde esteve um guarda redes inspirado.

Chegámos pois a Portimão com um balanço francamente positivo em termos de resultados, com a qualificação bem encaminhada na Liga Europa e na Taça da Liga e a possibilidade de ficarmos a apenas 1 ponto dos dois líderes do Campeonato, mas a derrota foi estrondosa pelo que logo se pediu a cabeça do treinador.

É verdade que o Sporting levou 4 e não jogou nada, mas parece-me que há que dar um pouco mais de tempo ao treinador para pôr a equipa a funcionar melhor e corrigir alguns erros, sendo que esta paragem até pode ajudar.

Romain Salin tem desenrascado e na Luz até brilhou, mas em Portimão esteve mal, pelo que me parece evidente que temos um problema na baliza. Resta saber se há soluções em casa, ou se em Janeiro teremos de contratar outro guarda redes.

Fredy Montero já começou a marcar golos, mas a ausência de Bas Dost é notória, principalmente quando a bola anda pelo ar. O seu regresso poderá ser uma grande ajuda e pelo menos irá dar outras soluções para o ataque.

Nemanja Gudelj foi o último a chegar. Talvez consiga ser o 8 que falta àquela equipa, alguém capaz de levar o jogo para a frente, mas Rodrigo Battaglia está longe do que mostrou na época passada e nunca vai ter a saída de bola que William Carvalho garantia. Talvez Stefano Sturaro possa acrescentar alguma coisa, um jogador que fez perto de uma centena de jogos pela Juventus não pode ser coxo. De qualquer forma substituir uma dupla como William e Adrien não é fácil.

Bruno Fernandes é outro que ainda não se encontrou, se bem que encostá-lo às faixas também não o ajuda nada, mas será sempre um jogador importante nesta equipa, pelo que temos de esperar que recupere a confiança e regresse à boa forma.

O problema do lateral esquerdo foi bem resolvido com Marcos Acuña, mas na direita Stefan Ristovski continua a ter muitas brancas e Bruno Gaspar também não foi capaz de fazer melhor quando foi chamado. Enfim é o que temos, mas pede-se pelo menos mais concentração.

Raphinha e Jovane Cabral tem sido duas agradáveis surpresas, embora a equipa ainda não esteja afinada para sair no contra ataque, pois falta-lhe essencialmente qualidade na construção, quer nas transições rápidas, quer no jogo pensado.

O processo defensivo até tem estado bem, com excepção deste último jogo onde a equipa encaixou tantos golos quantos os que havia sofrido nas seis primeiras jornadas, sendo que a maior parte deles resultaram de erros individuais.

Outra coisa de que eu tenho gostado é a atitude dos jogadores. Vê-se que há vontade, embora também se note alguma ansiedade natural dadas as circunstâncias e uma certa desconfiança entre jogadores e adeptos, desconfiança essa que em relação ao treinador ainda é maior.

Esse talvez seja o grande problema de José Peseiro, um treinador que entrou em Alcochete sem direito a tolerância, quanto mais a um período de estado de graça e que depois de Portimão ficou  ainda mais pressionado.

Sendo assim só lhe resta o caminho da vitórias no novo ciclo que se aproxima, com cinco jogos de vitória obrigatória nas três competições nacionais e um duplo confronto com o Arsenal, onde a equipa terá de pelo menos não fazer má figura.

José Peseiro teve a coragem de se meter neste Sporting feito em cacos com a passagem do "furacão bruno" e talvez tenha sido esse o seu grande erro, mas essa é mais uma razão para que eu tenha alguma condescendência para com ele e deseje que depois da época do quase, esta não seja a temporada do nada e que ele agora não fique na história apenas como um bom homem e um treinador medíocre, sendo que para isso terá melhorar muita coisa naquela equipa. Vamos ver se será capaz de o fazer e de se aguentar até à reabertura do mercado, o que já seria muito bom, pois também não lhe podemos exigir o céu.

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