Mudar de treinador para quê?

Uma questão que deve ser quase tão velha como a existência do futebol, pelo menos enquanto modalidade mais ou menos profissional, é a das chamadas "chicotadas psicológicas", muito vulgares quando os resultados desportivos não aparecem, principalmente num País como o nosso, que deve ter uma das maiores concentrações por metro quadrado, de grandes entendidos, ou mesmo génios, de questões tácticas.

O Sporting neste particular é seguramente um dos piores exemplos que podemos encontrar. Desde o fim do período de ouro vivido nos anos 40 e 50, até aos nossos dias, tem sido mais as vezes em que se troca de comando técnico a meio da temporada, do que aquelas em que o trabalho do treinador chega pelo menos ao fim da época.

Os resultados desta constante dança de treinadores são, ou pelo menos deviam ser, conhecidos por todos: em menos de 60 anos, tivemos cerca de 4o "chicotadas", e não terão sido mais do que meia dúzia, as que sortiram os efeitos desejados, sendo muitas as que tiveram elevados custos financeiros e desportivos.

Diga-se que nos últimos anos essa tendência tem sido invertida, e os dirigentes leoninos tem feito um assinalável esforço para resistir ás pressões vindas de dentro e de fora, para fazerem estalar o já tradicional "chicote".

Mesmo as duas últimas situações de que há registo, com as saídas de José Peseiro e Paulo Bento, resultaram de um ambiente praticamente irrespiravel, que tornou inevitável esses desfechos, mas que foi resultado apenas da pressão vinda das bancadas, que num dos casos até levou à demissão do Presidente.

Penso que se trata acima de tudo de uma questão de cultura desportiva, ou neste caso falta dela, da parte dos adeptos, que julgam que sabem tudo, e que muitas vezes se deixam levar por campanhas orquestradas na imprensa, e por alguns ilustres fazedores de opiniões.

A marcação cerrada que Rui Santos fez a Scolari ou Paulo Bento, em contraponto com a sua benevolência para com Carlos Queirós, é um exemplo claro do que acabei de escrever. Depois toda a gente sabe que há alguns órgãos de comunicação social, que estão ao serviço de determinados clubes e agentes desportivos, pelo que não perdem uma oportunidade para deitar abaixo tudo o que os possa incomodar.

O mais triste disto tudo, é que a generalidade dos adeptos se deixa levar, e não consegue aprender com os exemplos do passado, acabando por exercer uma pressão tal, que depois não há treinador que resista.

Neste momento não tenho dúvida nenhuma que Paulo Sérgio está numa posição muito fragilizada, e mesmo que Bettencourt resista à tentação de fazer a vontade ao pessoal do bota abaixo, ele dificilmente terá condições para continuar na próxima época. E é pena.

É pena porque ele me parece um bom treinador, que cometendo erros como todos cometem, e que são fáceis de detectar principalmente depois dos jogos terem acabado, não tem tido sorte e tem feito um bom trabalho dentro das limitações do plantel do Sporting, pelo que gostava que o deixassem trabalhar e construir a sua equipa. Acho que ele é suficientemente capaz para o fazer .

Dizem que um dos problemas deste Sporting é não ter um modelo de jogo definido, e estar sempre a mudar, o mais engraçado é que não há muito tempo Paulo Bento era acusado de só saber jogar com o losango, que durante quatro anos operou verdadeiros milagres, que no entanto não satisfizeram os vampiros, que que anseiam por sangue, e que não descansam enquanto não vêem cabeças a rolar.

Gostava muito que o Paulo Bento tivesse sido o nosso Ferguson, mas sempre tive a noção que os sportinguistas não tem cultura desportiva para permitir isso, e foram eles que no fundo destruíram o bom trabalho que ele estava a fazer, e que vão destruir o do Paulo Sérgio, e de todos os outros que vierem a seguir. Nem sequer o Boloni quando ganhou Campeonato Taça e Supertaça, escapou ao bota abaixo, e nem mesmo o Mourinho ia ter muito espaço para brilhar no Sporting, aliás a sorte dele foi que houve meia dúzia de paspalhos que não o deixaram entrar em Alvalade, onde seguramente teria marcado passo, sim porque o nosso problema está longe de ser um problema de treinadores.

De resto apostava de caras, que o agora muito badalado André Vilas Boas, se tivesse realmente vindo para o Sporting, já estava a ser comido da mesma forma que o Paulo Sérgio está, ou se calhar ainda pior dada a sua inexperiência, pois a diferença está na cultura instituída no nosso Clube, cujas raízes já se perderam há muito tempo, restando-lhe agora um largo numero de adeptos envelhecidos, cansados e conformados, e um grupo de jovens de pelo na venta, mas que não fazem a mínima ideia do que é o Sporting.

Falta acima de tudo uma liderança forte e carismática, uma ideia de refundação do Clube, respeitando o seu passado e olhando para o futuro com sensatez e inteligência, e percebendo o que é que temos de bom para potencializar, e onde estamos a falhar, para não se repetirem erros. Só que para isso é preciso alguém que não só tenha sensibilidade para o perceber, como tenha capacidade para fazer passar a mensagem, coisa que a actual liderança do Sporting não tem sido capaz.

Resta saber se ainda vamos a tempo de encontrar um iluminado capaz de operar essa revolução.

Comentários