Os inimigos externos

Paulo Bento e Miguel Ribeiro Teles deram recentemente entrevistas onde tocaram em várias feridas que há muito atormentam o Sporting, são declarações que eu considero relevantes, principalmente por virem de duas pessoas que conhecem o Clube como poucas.

Ambas as entrevistas apontam para dois tipos de inimigos, os internos e os externos, e se não é fácil lidar com os primeiros, em relação aos segundos há muito tempo que os nossos dirigentes tem revelado uma total inépcia para o fazer.

Julgo que esse problema remonta já há mais de 50 anos, quando a maior parte dos dirigentes sportinguistas estavam comprometidos com o regime salazarista, pelo que não puderam, ou não tiveram a coragem de lutar contra os favorecimentos de que o Benfica passou a beneficiar a partir de certa altura.

Seguiu-se o período pós revolução e o aparecimento do fenómeno Pinto da Costa, e do descarado "sistema" a ele associado, contra o qual João Rocha não foi capaz de lutar, acabando por deixar o clube à deriva, até ao aparecimento de um Sousa Cintra cheio de boa vontade, mas totalmente impreparado para se movimentar num terreno pantanoso como é o futebol português.

O chamado "Projecto Roquete" trouxe para o Sporting muitas ideias fortes, e uma nova geração de dirigentes que se arrisca a ficar para a história como os "anjinhos". A luta pela credibilização do futebol português tem sido uma guerra muito desgastante para o Clube, e com mais batalhas perdidas do que as ganhas.

Alianças desaconselháveis com os inimigos, que invariavelmente resultaram em facadas nas costas, comportamentos excessivamente cavalheirescos, e ás vezes até ingénuos, nas relações com os outros clubes e entidades que fazem parte, ou gravitam à volta do mundo do futebol, levaram a que os nossos dirigentes hoje sejam olhados como pessoas excessivamente educadas, tão diferentes que até conseguem ser os únicos que não foram apanhados nas escutas dos "apitos", e que se preocupam com as questões financeiras, chegando mesmo ao ponto de defenderam coisas como valores e princípios, ou seja uns tontos.

Na verdade os nossos dirigentes não só não conseguiram passar a sua imagem de defensores do rigor, da transparência, da verdade desportiva e dos comportamentos éticos, como hoje são vistos como seres estranhos, muito por culpa deles próprios, que falam, falam mas nunca levam nada até ao fim.

Ainda agora Ribeiro Teles referiu-se ao "caso Jardel" como algo tão maquiavélico que prefere nem falar, de resto João Rocha também tinha prometido pôr os pontos nos is quando o avançado brasileiro saísse do Sporting, mas ainda estou à espera. Não sei se eles têm medo de falar, mas o que é certo é que continuamos a levar na cabeça e a não reagir convenientemente.

As relações com a arbitragem são outra face da mesma moeda. O Presidente dos árbitros até é sportinguista, tal como o Presidente da Liga, mas também eles são diferentes daqueles artistas que tentaram legitimar os campeonatos ganhos à pedrada, e antes de mais não hesitam em afrontar quem não lhes faz frente, evitando confrontos com os que não olham a meios para atingirem os seus fins.

De resto vem aí uma nova luta pelos lugares do poder nos bastidores do nosso futebol, sem que se perceba qual será a estratégia do Sporting, continuar com o discurso dos coitadinhos e a acreditar na regeneração do futebol por dentro, tudo em nome da defesa de um negócio que assim só serve os outros, ou meter os pés à parede e partir a loiça toda, doa a quem doer.

O que não faz sentido é que sabendo-se que aquilo que Ribeiro Teles e Paulo Bento disseram sobre o corporativismo vingativo dos árbitros, é uma verdade indesmentível, José Eduardo Bettencourt se sente ao lado deles como se nada se passasse, e fosse tudo gente de bem, e até entre na dança de um árbitro que tem o desplante de dizer que se querem palhaços tem de pagar, e pagar muito bem.

Se eles já estão contra nós e nos andam a roubar há muitos anos, então vamos lá a deitar tudo cá para fora sem medo, em vez de continuarmos a tratar toda a gente bem demais como dizia o Paulo Bento e com toda a razão.

Se querem guerra, antes uma guerra aberta do que uma guerrilha em que o inimigo está cobardemente escondido.

Como o missal já vai longo, deixo os inimigos internos para a próxima oportunidade.

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