A continuidade versus a rotura

Apesar de Soares Franco ter anunciado que não se recandidataria à Presidência do Sporting Clube de Portugal a vários meses de distância das eleições, a verdade é que nunca deixaram de haver movimentações para o convencer do contrário, pelo que o nome do deu sucessor tardou em aparecer, e foi motivo de algumas divergências dentro da chamada oligarquia que dirige os destinos do Sporting há vários anos.

É curioso que o primeiro nome que apareceu foi precisamente o de José Eduardo Bettencourt, que no entanto se pôs logo de fora. A partir daí deram-se muitas voltas, mas acabou por ser ele a avançar um pouco à última da hora, quando já outros dois candidatos se tinham feito à estrada, e se calhar porque era o único suficientemente louco para o fazer e ao mesmo tempo gerar um certo consenso.

Sem muito tempo para apresentar um programa forte, esta foi acima de tudo uma aposta numa figura carismática que agrada à maioria dos sportinguistas, mas Bettencourt tem a obrigação de mostrar mais do que a sua boa imagem de sportinguista apaixonado, gestor competente e homem com uma grande sensibilidade para as coisas do futebol.

Todos sabemos que com Bettencourt podemos contar com um Presidente mais interventivo e próximo dos sócios e do futebol, e que a estabilidade nesta área vai manter-se, o que na minha opinião é o seu grande trunfo, pois parece-me que a gestão do futebol do Sporting nos últimos anos foi bastante positiva, mesmo que tenha falhado o seu objectivo principal, mas se calhar era difícil fazer mais, e continuo convencido que estamos no caminho certo.

O que me parece é que Bettencourt terá também de explicar qual a sua posição em relação ao plano de reestruturação financeira de Soares Franco, sem ter medo de enfrentar o incomodo passivo, sem isso ficará sempre sujeito a ser apontado como mais um que veio para o Sporting defender os interesses da banca, mas já se percebeu que ele não está muito virado para aí, resta saber se o conseguem obrigar a mostrar serviço.

No lado da oposição o parto do seu candidato também não foi fácil. Julgo que o Ser Sporting nasceu da junção de alguns grupos que há muito tempo contestam o rumo seguido no Clube na era do chamado "Projecto Roquete", e que assenta essencialmente num conjunto de ideias e boas intenções, que no entanto precisavam de um rosto forte.

A escolha de Paulo Pereira Cristóvão seguramente que não foi pacifica, e parece significar que ganhou a ala fundamentalista da oposição, pois trata-se de um nome pouco conhecido dos sportinguistas e sem nenhumas credenciais em matéria de gestão e de futebol, que parece ter emergido por ser aquele que estava disponível e que até já tinha alguma bagagem em termos de exposição pública.

Apesar de tudo isto a prestação de Cristóvão nesta campanha tem sido globalmente positiva, embora já se tenha deixado cair nas tentações da agressividade verbal, que em nada o ajudam pois apenas servem para afastar os moderados e dividir um Clube que precisa de todos os sportinguistas.

Resta agora saber quais são as ideias deste candidato em relação ao futebol, a área nobre da vida do Sporting, mas cheira-me que vão aparecer alguns nomes, o que mais uma vez em nada o irá beneficiar, pois nesse aspecto acredito que haja alguma diferença nos sportinguistas que ainda não se esqueceram da altura em que embarcaram na conversa das "unhas".

Concluindo parece-me que estão em confronto de um lado a imagem prestigiada de Bettencourt à frente de um Sporting dentro da linha dos últimos anos, do outro um conjunto de ideias preconizadas por um grupo de jovens radicais e idealistas, que defendem a rotura total com o passado recente, e para mim seria uma grande surpresa que os sportinguistas optassem pelos segundos, pois tal seria revelador de uma grande mudança na forma de viver o Clube, e de uma maturidade que não me parece existir ainda, até porque há alguns traumas que dificilmente serão esquecidos tão cedo.